12 janeiro 2011

Inesperado sol

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O senhor é um homem sonhador, e carajoso, disse o estivador, pode me chamar de Barroso, todos me conhecem assim, é claro que meu nome, como já me apresentei, é Justino, mas de fato prefiro o sobrenome Barroso, me acostumei, o senhor... deseja uma nova cerveja? perguntou na sequência da conversa deixando um espaço na fala para depois de senhor. Augusto, meu nome é Augusto, respondeu. Admirou-se da tranquilidade em dizer o próprio nome. O senhor Augusto é um homem corajoso, o senhor acredita mesmo que tudo isto pode voltar a funcionar? continuou perguntando referindo-se ao complexo industrial. Augusto sorriu, disse um talvez... talvez, e se foi retirando, pedindo as devidas licenças. Havia ali naquele homem algo que precisava entender melhor, depois voltaria e veria por onde o tal Barroso iria conduzir a conversa. Foi-se na direção de uma mulher com quem trocava olhares, conhecia muito bem as voltas e as sílabas daquelas miradas; a escola que frequentara, a casa de dona Irene, não lhe deixava falhar. Era linda a menina, não mais que vinte anos, mas exacerbada na sensualidade e no desejo de viver uma noite feliz. Com certeza o que isso dizia é que a vida que levava era uma vidinha dura e de muitos desprazeres cotidianos. Ele não se importou com isso, não se importava com isso com as mulheres de dona Irene que muito bem sabiam separar, ou se tinham treinado para separar, a pobreza de vida que viviam das coisas da cama. Dançaram e os passos da dança diluiram com a cerveja aqueles outros pensamentos, de correntes pesadas, que lhe amarravam a idéia o tempo todo: o que tinha feito, meu Deus, o que tinha feito? o que fazer agora? Quantos dias se passaram desde a morte de Rosimara, perguntou-se, não soube responder, não pensou mais nisso, o clima no bar instava-o outras coisas.

3 comentários:

Paula Barros disse...

"Dançaram e os passos da dança diluiram com a cerveja aqueles outros pensamentos, de correntes pesadas.."
Gostei deste trecho. Sei bem o poder da dança em diluir pensamentos.

Depois que leio, ainda fico horas a relembrar a história, e achando fantástica a condução que você consegue dar ao texto.
abraço

Paula Barros disse...

Dauri, eu que agradeço você me aguentar por aqui. rsrs
Um lugar que me conecta com as palavras, neste dias de estiagem de mim.
Estou com Eça de Queiroz e Saramago ao lado da cama reclamando que só leio Dauri. Mas blog é bom porque tem um tipo de interação, de troca, de "conversa". Queria dizer a Eça que estive em Leiria, que vi a casa onde ele morou. Mas deixa ele sem me escutar, não é mesmo? rsrs

E vamos lá, 2011 e muitas histórias e quero ler sua tese de mestrado.

abraço.

Jacinta Dantas disse...

Estou aqui pensando no nome do "gerente" - Augusto - um nome que me chama a atenção pelo que ele representa para mim. Alguma razão especial na escolha do nome da personagem?

Aliás, fico pensando, também, em como o enredo dessa história - nomes, cenários, contexto... vai se desenvolvendo, sendo construído por você.
Beijo

PS: e o nosso café hein?