22 novembro 2008

Cheiro de especiarias

...seguia adiante para ir longe.
No coração uma sede, sede de vinhos
e nada mais do que uma velha canção nos lábios.
Ir longe. Longe é ir-se,
afastar-se sem medida certa,
curar dores sem chagas,
feridas sem úlceras.
Poente é nome bonito,
nunca vem, sempre vai,
a cada dia levando o que se quer prender,
o que se tenta.
Fica. O que fica
é a insensatez de um olhar sem fim sobre as planícies.
Olhação calma e sufocante.
Planícies desatam pensamentos,
derramam-se por dentro,
gozam e esgotam os espíritos pelos olhos
para soltá-los como aves tontas,
tantas que se esbarram
umas nas outras
nos horizontes,
em festa, andorinhas bêbadas, embriaguez de tardes.
Ah, Planícies exigem uma boa reza
antes do primeiro passo. Que melhor se leve
um escapulário. Depura-se,
e em vermelhos de jaspe
o sangue se refaz.
Salvação dos olhos, a noite vem e à planície encobre.
Que bastasse agora, rezava, no quarto da estalagem,
pousada só por uma noite,
o cheiro de especiarias e outros vindos do armazém ao lado,
aguardentes, palavras ditas,
cravos, café, couros, versos,
pimentas, perfumes.

8 comentários:

ex-controlador de tráfego aéreo disse...

Oi Dauri,

Linda poesia, hein!

"Poente é nome bonito,
nunca vem, sempre vai,
a cada dia levando o que se quer prender,
o que se tenta".

Gostei demais dessa imagem.

Gosto das planícies, mas quando vistas dos cumes das montanhas.

Um abraço, poeta!!!

Sueli Maia (Mai) disse...

Oi, Dauri.
Coisa cheirosa, é um poema que atiça, assim desse jeito...
Tudo que conheço dos cheiros=especiarias, guardados na memória olfativa, foram mobilizados agora pelos teus Versos, Poeta-lindo.

Abraços.
Voltarei

eder ribeiro disse...

qdo eu chego aqui, eu me desato todo e vou sendo levado pelos seus versos e é qdo me entrego de vez a tua poesia que tentando me atar de novo vejo que sou a poesia. parabéns grande poeta. qdo te leio me sinto personagem. abçs.

Vivi disse...

Dauri!
Cheiros marcantes de especiarias (e outros mais) tornam mais agradável a viagem pela planície rumo à cura das dores...
Palavras-especiarias, como as suas, têm essa função também!
Belas palavras!
Um abraço!

Átila Siqueira. disse...

Belo poema amigo, me fez lembrar as cidades do interior, armazens que se vendem de tudo. Aquele ar bucólico e agradável que às vezes precisamos respirar para depois voltar para a loucura das cidades grandes.

Um grande abraço,
Átila Siqueira.

Jorge Elias Neto disse...

Prezado Daurí,

Essa sua escrita desenfreada, essa sua produção initerrupta de poemas, tem proporcionado um refinamento muito evidente de sua escrita.
Neste poema vê-se clara sua evolução como poeta.
Imagens marcantes, usando do que vc tem de melhor que o entendimento da insensatez do olhar humano.
Que chegue sempre aos nossos olhos a orgia dos sentidos ofertadas sobre sua mesa.


Um grande abraço,

Jorge Elias

:.tossan® disse...

Quanto literalidade, quanto lirismo! Abraço

:.tossan® disse...

Um estilo invejável, com uma qualidade poética e lírica muito envolvente e absurdamente lindo! Ah como eu queria saber fazer isso! Abraço