22 março 2008

Pássaros-cachorros

Deram-me palavras às colheradas e me mantive mudo.
Enfiaram-nas goela abaixo e me conservei em silêncio.
Palavras e água da primeira chuva de janeiro e não falei.
Elas subiam e se constituíam em bandos e voavam,
voavam lindamente em minha mente azul-ingenuidade
e eu me satisfazia em contemplá-las em revoadas.
Eram pássaros, e se falados - temia – eu sofreria.
Bem mais tarde falei, e vi que eles não morriam,
ganhavam, às vezes, um tom agressivo ou um ar embusteiro.
E falei, falei. Falei até amor sem ternura e gemidos sem dor.
Hoje vazam como sialorréia em cada canto de um sorriso
sem perfume, mas ainda com uns brilhos de azul.
Uma coisa esquisita. Pássaros-cachorros doidos silenciosos
perseguindo em caça um sonho: demudarem-se em poesia.

9 comentários:

Mike disse...

Grande Dauri,
viajei em teus versos
montei uma sequência de imagens na minha cabeça do homem imaginário (você, sempre tão misterioso) caminhando por um labirinto de palavras e observando-capturando uma ou outra palavra a fim de formar uma mensagem em versos... auto-expressão artística, dizendo um pouquinho de si e ainda mantendo-se em segredo.

Dauri Batisti disse...

Obrigado Mike,

teus comentários são sempre muito interessantes.

Quando você falou em sequência de imagens logo te imaginei dirigindo as cenas, um vídeo disso que rolou na sua cabeça.

Obrigado.

Camilinha disse...

Eu, um dia, fui só silêncio...
Vencida pela solidão que ele traz, me fiz reticente. Vencida pela incompreensão, me tornei pedra.

Pedra não voa, né?!

beijos daqui...

Dauri Batisti disse...

Oi Camilinha,

obrigado pela visita e pelo primeiro comentário-poesia. Gostei.

Quanto à pergunta-afirmação, pedra não voa, eu diria que voa. Há varias voando pelo espaço afora. Nós voamos. Gosto demais de voar no chão.

John Doe disse...

O que faz com as palavras, como consegue dar foprma e cor a elas, isso é algo que poucos podem fazer, suas palavras tem mais vida do que as coisas que vivem e estão mrtas por ai....

Dauri Batisti disse...

Caramba, John Doe

obrigado pelo comentário.

Obrigado por reconhecer, ver, sentir vida nas minhas palavras. É uma vida silvestre, talvez por isso...

Obrigado.

Luciana Cecchini disse...

surreal, meu caro. E tudo que é surreal tem poesia da boa: aquela que nos faz voar. Nos leva a ver em outras lentes. Nos faz feliz!

abraço!

Luci:)))

Dauri Batisti disse...

Querida Luci,

super real, real que doi, real prazer, viver. Super real. Você tem razão. Real que me faz voar na imaginação.

Anônimo disse...

Não poderias deixar estas palavras somente em sua mente, esses pássaros presos, seria muita crueldade não falar... ainda mais como é...parece nascente de água, daquelas que começam e nunca cessam! Brota em quantidade capaz de transformar-se em rios. Assim são suas palavras, transforman-se em lindas, deliciosas poesias que me fazem pensar em coisas que estavam passando despercebidas pela minha vida.
Fala tanto, caça sonhos, brilhos azuis, sorrisos, que nem sempre estão nos lábios, mais na contemplação do ser, lindamente na minha mente!

Ta valendo muito!

Abração