11 janeiro 2012

Desânimo?, preguiça?,  vontade de ir-se embora, viver outra vida? não!, aquilo era a vida, a sua vida, também não sabia direito o que queria fazer, só tocar a velha concertina do tio já falecido, isso queria, que ficava no paiol dos arreios, mas agora, agora teria que voltar ao cafezal, abandonar a sombra da árvore, árvore tão boa, tão triste, tão quieta de tantos anos e coisas vistas, uma árvore vê muitas coisas, fica parada e olha todas as direções, tomou as coisas, a peneira, a água, teria que ir, havia muito café a apanhar, o sol escaldava as idéias, mas iria, e já ia, um atrás do outro, seus irmãos, roupas de trabalho todas manchadas e remendadas, pensava demais, pensava na concertina, em música, em ficar no cômodo das selas e arreios, naquela velha cadeira tocando, aprendera observando seu tio, maravilhoso tocador, mas bruto como um cavalo não amansado, jamais ousou pedir umas lições, tinha olho e ouvido para observar, que aprendesse por conta própria, queria ficar tocando, tocando e inventando música, umas letras de amor com português errado, sua professora falava bem português, não tinha mistura de italiano, viera de Vitória. O que faria? Iria para o cafezal, olhou para as mãos duras como couro mal curtido, lembrava enquanto seguia, na mistura de pensamentos, do amigo que fora caçar e matou-se. O que aconteceu ninguém soube, dizem que não queria servir o exército, corria a notícia que alguns rapazes da região que serviam em Vitória já tinham sido enviados para o Rio de Janeiro, já esperavam ordem para embarcar para a Itália, melhor rezar por ele uma ave-maria, mesmo que viesse a se perder na reza, na segunda parte, antes da hora da nossa morte, sempre se perdia quando rezava sozinho, mas devia rezar por ele, os urubus uns dias depois marcaram o local, foi encontrado, tinham sido amigos de escola, sentia pena dele, estava com tudo pronto para o casamento, também ninguém explicava como fora assim decidir casar, nem se sabia que ele estava namorando, ia casar bem novo, com 17. Pensou, à noite, mesmo cansado e com as mãos duras iria tocar, viriam alguns, se sentariam ali, sua mãe, uns irmãos, os mais novos, uns empregados, seu pai ficaria da varanda observando o mundo, e esqueceriam a vida.

11 comentários:

Paula Barros disse...

Olhei bem se tinha alguma palavra com outra cor na esperança de ouvir uma música na concertina.

A história prende a atenção. Envolve.

Dauri Batisti disse...

Oi Paula,

vim agradecer a lembrança de uma música para minha postagem de hoje. Como estava meio sem idéia de qual, partí para uma certa, que gosto muito. Olha, não sou lá grande entendedor de música clássica, mas tenho apreço por Gustav Mahler. Escolhi o "adagietto" da 5 sinfonia que não me canso de ouvir.
(aumente o volume do som)

Paula Barros disse...

Dauri, escutei. Bonita, senti um certo tom melancólico. Depois escuto mais e mais.
São boas estas trocas. Amplia conhecimentos, inclusive li sobre a biografia dele.

Hoje a tarde procurei músicas tocadas com concertina, encontrei muitas músicas portuguesas.

abraço.

eder ribeiro disse...

Esquecer um pouco da vida para achar a vida na música. Abçs, Dauri.

Dauri Batisti disse...

Exatamente isto Eder.

Obrigado pela visita.

Dauri Batisti disse...

Sim Paula, é melancólica sim, mas pensei nessa música como fundo para o conto. Não dava para, do conto, criar um link para outro tipo de música. A música quando aparece num texto meu não é apenas uma música que gosto, mas também que se afine com o que está escrito.

Paula Barros disse...

Sim, Dauri, eu sei que sim. Apenas coloquei o que senti, até para ir trocando impressões, sensações. Pensei até ter sentido errado a bela música.
E tenho gostado destes links.
Sabe, quando comecei a vir no seu blog tinha uma série que o personagem viajava escutando música, não sei se naquela época você já colocava o link. E eu nunca procurei as músicas no youtube. Quelquer dia faço isso.

um bom dia!

Paula Barros disse...

Dauri, neste momento 9h, estou ouvindo a música. Trocou? Este video esta com as imagens lindas, belíssimas.
Trouxe minhas caixinhas de música para o trabalho e o teste foi aqui neste link.

Assim, agora, o dia passará melhor.

Paula Barros disse...

Interessante, num computador entrou Adagietto e no outro entrou Adagio.
Por isso perguntei se vc tinha trocado.

vitalina de assis disse...

Hola amigo Dauri!

Excelente texto, gostei muito.

Parabéns pelo blog.

Paula Barros disse...

Neste conjunto de barcos, vejo no primeiro barco o nome Tossan, no segundo um coração...pode até não ser, mas vejo.

Gosto quando você atualiza mais rápido seu blog, gosto de ler.

abraço.