28 março 2009

Esta série "OVNIS" tenta, nestes meus caminhos avessos de poesia, ligar o ordinário da dor com extraordinarios eventos, a angústia cortante do cotidiano com os vislumbres das coisas do céu. E, além disto, outras coisas. Obrigado aos que me seguem nestes caminhos estranhos e aos que me deixam comentários.

IV

Andava de bicicleta na estrada da praia
desprendendo com o olhar a lua do céu
para aliviar-se das preocupações. Perdera o emprego.
Brigara com a mulher. Ouvia ecos de antigas risadas e crenças.

Agora a dor. A vida pode impedir a arte.

A vida obriga, impõe caminhos, realidades.
Palavras secas, copos vazios, olhos ardentes
tomam o tempo, desgastam os passos.
Logo, devia declarar a si mesmo o fracasso

e o pequeno tempo de vida de um amor bonito...

Parou a bicicleta, pousou o pé no chão por um instante,
olhou o fio minguante da lua e pensou em compor um poema
de desabafo, de águas de poços bem fundos e escuros.
Neste momento viu no céu um objeto voador,

luminoso, diferente de qualquer coisa conhecida.

Um tempo novo estaria começando?
O disco girou lentamente e aproximou-se.
Viu janelas, portinholas com luzes diferentes.
Portas sucessivas cerravam-se para ele,

sem emprego, sem dinheiro, poucas condições para amar.

Mas um pequeno pássaro amarelo de sol
estava sempre pronto a voar, mesmo que
a gaiola a cada dia parecesse menor. Sentiu
uma pressão na cabeça com a luz forte muito próxima.

O que acontecia era tão cortante, frio.

Recebeu mentalmente uma ordem.
Substâncias de estremecimentos e silêncios
pareciam escorrer pelos seus pensamentos.
Sua mão tremia tomada por uma força inteligente,

mas destituída de qualquer sorte de amor.

Então perdeu a consciência.
Ao acordar seu coração estremecido surpreendeu-se
de um papel que tinha na mão. Nele sem saber como
um poema estava escrito, a letra era a sua, mas o poema...

...era tão sem graça.

10 comentários:

Ava disse...

Dauri, vá entender os poetas...rs
O seu poema é lindo!
Mas queria ler o poema dele...rsrsrs
Achei incrível como termina...
Parece aquelas historias de criança, que a gente torce pro final feliz...
E foi feliz para sempre!

Beijo avassalador!

Sueli Maia (Mai) disse...

É como se estivesses falando de um hiato, um lapso, um branco no tempo em que o pensamento viaja... Uma espécie de 'piloto automático' nos faz abduzidos, mesmo...

E se a poesia poderia ser a tentativa de ter aquilo que não pudemoster, compreendo o poema ser sem graça. Após o transe, a dura constatação.

Um Beijo

Paula Barros disse...

Dauri, quando comecei a ler vi que hoje seria outro escrito fabuloso. Levei o seu poema e fui registrando onde paro, respiro, penso, perco o fôlego, me perco em pensamento. Vou colocando meu comentário junto a frase poética e reflexiva que me toca.


“desprendendo com o olhar a lua do céu” É lindo e aqui fiquei suspirando.

“Agora a dor. A vida pode impedir a arte.”
Mas uma parada,para pensar em mim, na vida. Na sabedoria escrita. E é um desafio tirar da dor a arte, e se reconstruir, e mesmo remendada, trincada, tentar ser inteira.

“olhou o fio minguante da lua ...” Penso: Ele está arrasando, e paro de novo, e coloco a mão no queixo e me perco em pensamentos.

É impossível ler você, sem ter que reler, as paradas são automáticas. São brecadas poéticas.

É a vida em tudo, de todas as formas, as diversas vidas. Penso que meu lado que já sofreu e o que já foi feliz, se olham no espelho das suas palavras e se veem.

É vida, as relações, e o amor. As combinações, com as porções de cada.

Gosto, do ler, do me sentir.

abraço

Paula Barros disse...

Depois que comentei foi que li sua explicação da série.

E fico rindo.

O que seria o avesso da poesia?

Fui ao dicionário, avesso, poesia, contrário, inspiração, versos....e desisti, uma coisa puxa outra. E não me convence. E se tem para uma definição três explicações, eu pego a que eu quero.

O canto é seu, as palavras são suas, o sentimento é seu, você define. E eu desrespeito, com carinho. Pois sou levada para dentro de mim pela luz das suas palavras nave.

Mas é impossível para mim não ler as frases poéticas. Elas são feito crianças chamando atenção, pulam do texto. Elas me encantam, me emocionam.

Vou me interromper. beijo

Márcio Ahimsa disse...

...a autenticidade da letra revela o que há de mais essêncial, o poema, escrito pelas arestas do sonho de voar passarinho amarelo, que, uma vez fora do ninho, tende a bater asas mais alto, além, infinito...

Muito bom, amigo.

Abraço.

Paula Barros disse...

Dauri

Você comenta pequeno e bonito. E eu cheia de palavras. rsrsr Um dia vou aprender a comentar aqui pequeno.

Gostei do seu comentário.

beijo, boa semana, cheia de idéias e vivências.

lula eurico disse...

Quantas naus alienígenas em nosso trivial cotidiano, não é, Poeta?

Unknown disse...

"Destituída de qualquer sorte no amor." - É o quarto ou quinto blog que leio hoje onde o amor figura como uma sugestão quase impossível. Minha vida anda cheia de discos voadores. Eles, repletos de mim. Texto muito bacana. Abs!

Unknown disse...

Muito legal :)

ex-controlador de tráfego aéreo disse...

Oi Dauri!

Obrigado pela leitura e comentário.

Lindo poema, com imagens ricas.

Fico pensando e decido que a rotina cotidiana do poeta é sempre diferente, pois é fruto da observação do simples, extraindo dele as imagens que o vulgar jamais vê.

Um abraço fraterno!!!