23 maio 2008

Numa rajada de vento

Desejo um vermelho, um afogueado céu amanhecido
no horizonte dos caminhos que me levam embora,
numa aventura que começou de madrugada numa rajada de vento
quando a noite gemia em despedidas
com suas sombras filhas renegadas de sol.
Tomei um velho mapa apressado que de nada serviu
e com o dia bem alto já estou aqui, longe, não sei onde
num restaurante de beira de estrada,
triste, sentado na calçada, olhando as pessoas
sem saber a que horas chegará outro sopro de alegria
para me por de novo na sorte, no rumo, no destino.
A vida toda tem sido assim.
Sou levado por lufadas de alegria,
ventanias tão ligeiras que me levantam
como palha queimada e me deixam cair cinza.
Outros dias, os pesados, sem ventos,
se alongam por séculos mesmo que em poucas horas
e dominam meus pulmões, controlando o ar que respiro,
oprimindo os meus sonhos, alquebrando-me o andar.
Nem bruxedos, nem rezas, nem ervas, nem fármacos resolvem.
Só as lufadas de alegria, só elas me põem a andar bem.
Vou... mesmo sem rajadas, vou andando a pé.
... são três horas da tarde. Adeus.
Anoitecerei noutro lugar, mesmo que logo ali.
Fica com Deus.

9 comentários:

octavio roggiero neto disse...

poeta Dauri, depois manda pro meu e-mail um endereço postal pra onde eu possa mandar o poema anônimo na manhã de ontem, o derradeiro livro de meu pai.
tenho certeza que, assim como eu, ele iria adorar ler o que você escreve.
aqui, as palavras parecem fluir com uma facilidade, suavemente.
aqui é tudo lindo, forma e conteúdo.
fica com Deus!

Joice Worm disse...

Nossa Dauri...
"Sou levado por lufadas de alegria,
ventanias tão ligeiras que me levantam como palha queimada e me deixam cair cinza."
Tudo é uma questão de "ponto de vista" e "atitude". Se você se vê como vítima, você "É" a vítima e morrerá. Se você se vê como "a lufada de alegria", verá que fará respirar de alívio a muita gente.
Mude de atitude. Levante-se e respire fundo. Aproveite tudo que vem ao seu alcance. Mesmo as adversidades.
Não sei se a intenção do poema era um desabafo, mas assim foi o que senti. E não descansarei enquanto a poesia não se levantar.
É bonita, mas é triste. "Anoitecerei em outro lugar, mesmo que logo ali". Não. "Amanhecerei em um lugar melhor. Mesmo que seja logo ali".
Beijos positivos da Joice para ti!

Dauri Batisti disse...

Querida Joice,

escrevo ficção em poemas. Criou-se essa idéia de que poesia é sempre desabafo. Não é o meu modo de entender. São personagens que crio e o poema fala do mundo da personagem. São poemas-contos, entende? Crio um personagem. Este é um destes andarilhos que a gente ve por ai. Um alguém que até pode ter sido "alguem" e que caiu na estrada.
Costumo dizer que não escrevo com sentimentos e concordo plenamente com Fernando Pessoa: escrevo com a imaginação.
Obrigado pela visita.

Elcio Tuiribepi disse...

Olá Dauri, aqui os versos estão sempre madurados, e concordo contigo em parte, nem sempre escrevemos com o nosso próprio sentimento, costumo dizer que as vezes escrevo com o sentimento dos outros...grande abraço...bom final de semana amigo

Joice Worm disse...

Melhor assim Dauri. Fico mais tranquila. Já reli com outros olhos e introspectei de outra maneira. E a profundidade do personagem atinge qualquer alma.
Vou passando para ler os poemas atrasados que ainda não vi todos. Me aguarde...

Anônimo disse...

Caríssimo poeta. É comum eu receber comentários, sempre dirigidos a mim, e não ao "texto-em-si".
Principalmente quando coloco o texto em primeira pessoa.Acontece a você também...rs
"Numa rajada de vento", vejo a força quase "cega" que move o andarilho, ou o itinerante, que se vai, "a pé", sem saber o itinerário, "numa "aventura".A alegria é passageira, mas ela consiste justamente em "ser levado"...não? Os dias "sem vento" do passado são "opressores". Melhor andar, até mesmo "sem rajadas". O que ficar com Deus, ficará parado.
Para o "viajante", viver é ser "nômade", pois...
Seus poemas têm um tom intimista, de onde depreendo miudezas de existências...
Eu gosto.
Abraço grande.
Dora

Alice disse...

... mas que bons ventos sempre façam suas mãos desenharem palavras tão lindas para nós !!

bjus pra vc
Alice

John Doe disse...

perfeito, eu queria fazer isso, quem sabe viver assim, de lugar em lugar só pra ver até onde a vida me leva...

Beto Mathos disse...

Acabei de ler sobre a saudade no poema postado hoje.
Essa rajada de vento também tem saudades, embora a tenha com outra cor.
Grande abraço!