Eu precisava de um amparo quando li aquele poema chinês (novo conto)
Eu precisava de um amparo quando li aquele poema chinês, eu
procurava um amparo, ou um impulso pra me levantar, rolei com os pensamentos,
não sei se rolei ou me arrastei, parecia que eu tinha batido a cabeça em alguma
coisa, ou alguma coisa tivesse batido na minha cabeça, as nuvens, as nuvens me
acordaram, vi as nuvens quando acordei, o céu estava mais próximo, o céu azul
de fazer os olhos se fecharem, ou foram as formigas, as formigas que me picavam
me despertaram daquele poema chinês.
Eu fiquei caído ali, olhando as nuvens passando devagar naquele azul
muito carregado de luz, eu nunca usaria uma camisa daquela cor, todos me olhariam
também, não gosto que me olhem, muitos, gosto apenas que alguém me olhe, as
nuvens se amontoavam num lado do céu.
Ah, não lembro mais onde o sol se levantava lá naquela vila
onde cresci, naquele tempo eu não me preocupava com o tempo, o sol podia se
levantar e se esconder e tudo continuava como sempre, se a laranjeira floria e
depois dela colhíamos doces laranjas pra se chupar ao seu pé, se um milharal seco
era quebrado ao se recolher suas espigas e logo o arado lhe misturava com o
chão, palhas viradas em terra, nada mudava.
Aquele homem não existia no poema chinês, ele se metia nele,
as pessoas se intrometem, mas ele, apesar de intrometido, demonstrava querer me
ajudar, ele me reerguia do chão com palavras boas, não me pergunte quais,
palavras boas não são aquelas que você pensa, são aquelas que você ouve, mornas,
calorosas de um afeto mesmo sem sentimento, porque o homem não me conhecia.
Ele me levou para algum lugar, me pôs sentado numa espécie
de fundos de uma loja, outras pessoas chegaram, uma mocinha linda com um copo d’água
na mão e outro no olhar, preferi este último, mas bebi aquele. Então se repetia
a pergunta que só agora eu conseguia ouvir, o que aconteceu rapaz? Eu não sabia
responder, apalpei os bolsos da jaqueta e não encontrei o livro de bolso, o livro
de poemas chineses.