Inesperado sol
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Às escondidas, por vias que não se sabe quais, de repente, uma serpente de imagens recordosas se insidiou por sua mente, sem veneno, sem susto, quase como amiga. Era uma serpente vencedora, vencedora pela simples presença nele, delimitando território, garantindo domínios. Se a manhã se levantava inquestionável sobre as decadências daquele lugar, as recordações se sobrepunham em tentativas orgulhosas sobre as culpas, a culpa. Foi o que foi, ele pensou, se por suas mãos ou não, o destino tecera seu manto com o fio do carretel dos acontecimentos.
O fato de ter parado a caminhonete ali deflagrava e revelava talvez um segundo movimento causado pelas recordações, à despeito do seu querer e de sua bem sucedida fuga, o movimento da sua mente queria a afirmação de uma verdade. Mesmo que incerto das palavras havia entre o olhar disto e daquilo naquele mundo abandonado uma insistência que forçava a lingua para a voz, e mesmo que por contenção na garganta ele dizia que a amava. Sim, era amor. Todos falam de amor e aquilo era amor, aquilo teria sido a sua experiencia de amor. Ele a tinha amado, dizer que não era amor seria como negar que o sol se infiltrava naquele lugar de abandono.
A realidade da manhã, a convicção que afirmava como amor o que sentia por ela, não se manifestava todavia na clareza em relação ao dia da semana. Seria terça ou quarta-feira? Tinha mais dúvida aqui. Estacionara numa bifurcação; uma via se ia para a pequena siderúrgica e o estaleiro, a outra ia para um tipo de vila operária
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Às escondidas, por vias que não se sabe quais, de repente, uma serpente de imagens recordosas se insidiou por sua mente, sem veneno, sem susto, quase como amiga. Era uma serpente vencedora, vencedora pela simples presença nele, delimitando território, garantindo domínios. Se a manhã se levantava inquestionável sobre as decadências daquele lugar, as recordações se sobrepunham em tentativas orgulhosas sobre as culpas, a culpa. Foi o que foi, ele pensou, se por suas mãos ou não, o destino tecera seu manto com o fio do carretel dos acontecimentos.
O fato de ter parado a caminhonete ali deflagrava e revelava talvez um segundo movimento causado pelas recordações, à despeito do seu querer e de sua bem sucedida fuga, o movimento da sua mente queria a afirmação de uma verdade. Mesmo que incerto das palavras havia entre o olhar disto e daquilo naquele mundo abandonado uma insistência que forçava a lingua para a voz, e mesmo que por contenção na garganta ele dizia que a amava. Sim, era amor. Todos falam de amor e aquilo era amor, aquilo teria sido a sua experiencia de amor. Ele a tinha amado, dizer que não era amor seria como negar que o sol se infiltrava naquele lugar de abandono.
A realidade da manhã, a convicção que afirmava como amor o que sentia por ela, não se manifestava todavia na clareza em relação ao dia da semana. Seria terça ou quarta-feira? Tinha mais dúvida aqui. Estacionara numa bifurcação; uma via se ia para a pequena siderúrgica e o estaleiro, a outra ia para um tipo de vila operária
11 comentários:
Dauri, me ensina a escrever assim? Meu Deus! "...uma insistência que forçava a lingua para a voz..." seria sublinhado por mim com luz neon. O que dizer mais se é lindo e perfeito,tudo o que queria escrever e não sei como.
Beijos
Sentir o amor ou UM amor e não estar certo do tempo ou do dia a correr.
A imagem da 'serpente' me impeliu de imediato a pensar como o 'sentir' pode ser percebido como tentações, culpas, 'pequenos deslizes' que assombram a memória e tomam vulto e, por vezes apavoram.
O universo masculino. Tem sido (para mim) uma tônica neste teu conto que estou gostando deveras.
O homem que tão forçosamente é 'obrigado' a ser forte e prover, precisa mais é aprender a sentir sem sentir-se fraco.
Muito bom!
um beijo
Ler com o coração...
Nada mais!
A intensidade de tuas palavras dá o rítmo alucinante nessa história.
E olha o paradoxo; apesar de toda a calmaria física que gira em torno do protagonista, o rítmo não se perde...
Beijos meus!
Escrever é permitir a fluidez das idéias que se somam e modificam de versos para prosa. Eu não sei escrever, mas sei ler. A tua escrita é difícil, mas é uma arte. Abraço
Dizer que não era amor seria como negar que o sol se infiltrava naquele lugar de abandono.
Isso é amor, quando o Sol consegue alcançar os abandonados, os rejeitados, os desvalidos...
Obrigado pela presença...faz o seguinte, nõ precisa ser um Kaikai, pode ser uma frase como esta que destaquei...participe...tua escrita nos enche de orgulho...
Nem preciso deixar o convite...rs
Um grande braço na alma e um beijo no coração amigo.
"A realidade da manhã, a convicção que afirmava como amor o que sentia por ela, não se manifestava todavia na clareza em relação ao dia da semana. Seria terça ou quarta-feira? Tinha mais dúvida aqui. Estacionara numa bifurcação; uma via se ia para a pequena siderúrgica e o estaleiro, a outra ia para um tipo de vila operária"
A fruição da tua prosa está nisso que percebo no trecho colado acima: um implícito lirismo reflexivo que dá o influxo à narrativa.
Nada mais poético do que a convicção da claridade da aurora e do amor experienciado. No entanto, a luz do Sol não determina o dia do calendário. E aquele que foge não tem mapas diante das bifurcações da estrada.
Resta a dúvida da data e do caminho a seguir. On the roads... pé na tábua, Jack...rsrsrs
Abraço sempre fraterno.
QUERIDO DAURI, COMCORDO COM O TOSSAN, A TUA ESCRITA É DÍFICIL, MAS MARAVILHOSA...!!!
BOM FIM DE SEMANA... ABRAÇOS DE CARINHO E AMIZADE,
FERNANDINHA
Neste caleidoscópio de palavras inundadas de matizes,vejo-me envolvida e absorvida por esse cadinho de idéias e sentada na bifurcação da vida,fico a esperar um novo INESPERADO SOL.
É sempre prazeroso ler você.
Abç
Ótimo, tua narrativa é o que os entendidos - não é o meu caso - chamam de intrigante! E pelo menos a mim intrigou bastante! Vai escrevendo que com prazer irei lendo tá?
Um araço!
estou acompanhando...
Como Eder... também estou acompanhando e adorando.
Essas bifurcações....
Saudades!
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