31 agosto 2009

Vou cuidar do que escrevo,
e cuidar descuidando,
cuidar sem cuidar,
cuidar deixando.

Meu poema anda
despoemando a poesia,
amor.

Bem,
não sei que amor é este,
nenhum amor que aprendi,
um amor que foi assim
me deixando por aí
nas estradas
do que se pode ler. Gibís,
Gilles Deleuze, Tereza,
Machado de Assis.

Tem resto de terra
no descuido das minhas mãos.
As tintas e os teclados
se partem em despoemações do
mundo. Desdigo-me.
Das coisas
desaprendi tantas.
Algumas me falaram livros,
outras me comeram nomes
e me deixaram
em frases incompletas.

Das coisas, outras vezes,
me enriqueci,
foram boas.
Boas coisas.
Mas também me empobreceram,
quando pesaram
como ouro
e me impediram voos.

Afinal sou coisa,
mas não aceito ser mais
coisificado. Os sonhos
e a poesia trazem-me à tona.
Meus desejos transcendem-me
de uma coisa para outra

luz.

Abraço,


A curva no fundo escuro,
iluminada, arquitetura
de inspirações
e expirações, albergues
de vísceras e pulsações,
fomes e desejos. Costelas.

Elas, as flores no jardim,
sem saber, ancoram meus olhos,
e sustentam minha coragem.

Meu peito doi, minhas costelas
apertam meus sonhos. Minha
ansiedade por tua volta
me torna bem maior
que minha caixa toráxica.

Espero-te.

Os prazos me atormentam.

Um abraço,


...habitamo-nos
no desvão da matéria
e no peso da alma.

A face é o reflexo do devir,
do que há de ser
(e talvez não seja).

O coração é o que fica
entre o que se planeja
e o que se executa.
Ânsia. Uma flor ontem

caiu antes que a lua.
O dia de hoje ficou incompleto
mesmo, e apesar,
do amor.

Um abraço,
(comentários, intertextualidades)

28 agosto 2009

(aqui) faltam letras, inarticulam-se
palavras em sangue escorrido em lamínulas.

As vertentes da mente pendem
para o coração. Acelerado
cavalo solto em pasto amplo,
peito apertado, pensamentos
e imaginações. Sobressaltos.
O braço sobre o apoio.
A moça de branco depois do bom-dia
virou-se em seus eixos,
tubos e seringas. Fina,
bem fina, introduzida na veia, a agulha

sem linha. O olho costurando tudo,

vendo o que não se devia ver.

Comum, era assim, o azul
da veia estufada bem no meio
do braço, um riacho na curva, novelo
desfeito, um riacho em cheia,
subterrâneo. A azul
nobre vida vassala, ordinária,
ali, misteriosa. Glicose
colesterol, tri. Triglicerídeos,
sustos e anos que passam.
A infância ainda perto
dos sonhos, a infância tão longe (...)

sempre tão perto nos medos.

27 agosto 2009

(aqui) faltam letras, inconstituem-se
as rimas em versos desarticulados.

A sala apertada, a ânsia e a esperança na
sala apertada. Olhos de expectativa, entrevista.
Falar o quê, mostrar-se quem.
O vento levou as folhas, embora secas.
Ocupavam o coração com ilusões de
uma pequena fogueira, um sol de boa luz.
Deixou um vazio, um limpo vazio.
O que alguém pode ser quando
não se tem um trabalho. O pão.
Submeter-se em vôos sem resistir

às nuvens de tristezas, frustrações. Sonhos

de um dia. Um caminho bonito, um salário.

Quando o que se tem é uma roupa boa,
um sapato bem engraxado, mas a voz
embargada. A resposta, a porrada.
A entrevista foi mantida, mas a vaga,
a vaga já foi preenchida. Espera. Quem sabe
surge outra vaga. Vago amor de continuar
a acreditar. Um choro num sorriso.
Aperta. Dizer obrigado e sair da sala.
O universo não tramou, rabiscou
traços, raios, raios no destino (...)

É hora do almoço. Só o dinheiro da passagem.

26 agosto 2009

(aqui) faltam letras, incompletam-se nessas
ruas de versos bueiros e inseguros cruzamentos.

A rua molhada, o asfalto com olhos
de fogo, brilhantes nadas no chão,
fila interminável de volta pra casa.
Lá fora, fora do carro um olhar se vai
e se perde em pequenos pedaços
de sonhos, ânsias grandes por dentro,
alma, almas perdidas de um tempo
que se quer pra rir num bar, num café.
O que se quer, o que se quer, é, talvez,
ir sem sentir tanto, sem sinto de segurança,

sem multas, sem contas. Mesmo que só

por uns dias. Férias, feriados que passam

como o ar do bailado do beija-flor
nos jardins dos anos, distantes.
No fim de uma quarta-feira qualquer
a singularidade da vida no semáforo, parado,
sem ser, sem ser, sem ser
nada mais do que um a mais, isso, engolido.
No sinal vermelho ouvindo uma música
sem ouvir, ainda distante de casa,
peso, fardos, quadro pendido
na parede com manchas, mofo (...)

Pra dormir. Ai meu Deus. O remédio acabou.

25 agosto 2009

Um sentimento, um incômodo,
a ferida latejando. O sino de outro dia
anunciando a alma à beira do desfiladeiro do coração.

Mais um dia que se levanta contra a eternidade.

O cenário invadindo os olhos ainda fechados,
o sol pedindo a palavra
que não se consegue, não se consegue dizer.

A estrada da volta para si mesmo.

Apertar ainda mais os olhos cheios de palavras,
forçar o atraso do sol mantendo-se sem dizer nada.
O corte se abre, a janela, o tempo segue,

o poema se perde nessas palavras nubladas.

A escolha certa da flor errada,
espinhosa, a mais bela, amarela. Será
um dia bom pra se amar, mesmo assim.

Novas horas para se redoer de poesias.

21 agosto 2009

Talvez uma tristeza seja, uma alegria,
só o tempo de uma música.
O olhar dobra-se com o vento sobre os montes.

O sol brilhando o fim do dia atravessa o amor, vai.

A marca seca de sangue na faixa
recorda um passo, um tempo, um espanto.
O alívio vem em gotas.

A lentidão da vida é só para a dor.

Ainda é possível atravessar o rio,
colher abil e ficar com os lábios colados,
cheios de palavras doces. Ainda

nada é. Tudo é. Brincar é o que importa.

Um emplastro sobre o furúnculo,
uma lâmpada muito fraca para a sala
na noite de chuvas, quando todos dormem.

Como e onde se pode guardar um momento?

20 agosto 2009

Fragmentos de momentos
mundos que giram nos mundos de mim, palavras
e conflitos, ambição de dizer qualquer coisa.

O que vai longe vai sem asas.

O brilho do vagalume
não ilumina caminho nenhum.
É urina o que na escada escorre.

O odor de um poema pode ser dourado.

Haverá de parecer nobre o azul
de certas palavras, em versos,
mas o cobre no chão é outra coisa.

Isso é uma atadura que se soltou.

O que se põe com letras por ai
não representa sentidos,
mas bifurcações.

Escorreu o que foi dito e logo secou.

19 agosto 2009

Represei as palavras
para ver no que dá. Elas se espraiam
sob as sombras das árvores.

Fiz um barco e pus no lago.

Delineia-se agora
na gaze sobre o corte
uma palavra de sangue.

Lancina-se a alma em caminhos.

O que foi dito
há muito tempo, latejou
e escorreu da tumefação purulenta.

A vida dói, mas é a única poesia do cosmo.

Brilha um sol tímido
no retiro, nas planícies.
O monge manca.

Não há vômito sem revolta.

14 agosto 2009

Não ando deprimido,
nem triste,
ando calado.
Calado me afundo
nessa mansão
e adentro por um salão
onde tudo o que é frágil
fica mais frágil ainda,
o que é denso fica tênue,
o que dura se corroi.
Quero escrever a gramática destes tempos,
dias em que calar é uma imposição
de algo, de alguém, de algum
outro eu mesmo sobre o coração.
Perco a língua, ganho olhos.
De tanto olhar, olhar, tudo
o que pelos olhos entra,
pelo olhos começa a vazar.
E o que vaza, traindo-me,
talvez escreva um sofrido entendimento
do que se passa, do que me passa.
Envergonho-me de mostrá-los, todavia. Sei
que faltam letras
no meu alfabeto de olhar.

13 agosto 2009

Vai-se
na noite áspera
um desejo de poesia.
Magma na pele rasgada,
palavras explodem
no impacto com pesados volumes de anseios
que viajam sem rumo pelo espaço.
No início um grito por dentro,
um grunhido depois, um pormenor.
Uma frase, um ponto,
poeira no fim.

10 agosto 2009

Uma flor
é uma flor,
perfeita por ser
uma flor.

Cada flor é um sol
com outras cores,
o fogo desdobrado
em muitas manhãs.

Mas um poema
não é um poema; é
imperfeito por ser
um poema (de um não-poeta).

Cada poema é uma sombra,
cinzas palavras,
carvão e rabisco
de um sol que se pôs.

09 agosto 2009

Sair calado,
sorrateiramente,
e dizer aos ventos
palavras cambaleantes.
Ganhar mais um pequeno e contente momento
somado na conta de muitos.
Riscar versos nas páginas e ludibriar
os poetas. Se aproximar deles
só para roubar-lhes os olhos de ver,
e gastá-los,
às tortas e às direitas,
na maior farra.

07 agosto 2009

A rua e a cidade,
qualquer coisa
me fala de uma luz
bem no fundo do que há em mim.
O que há em mim?

Eu mesmo, eu mesmo dentro de mim,
uma luz-treva,

uma luz que ainda não é
luz-luz. Será? O olhar é vago. Nublou,
não chove, nem relampeja. O olhar
cortou a noite em claro,
separou o ontem do amanhã

e eu,
nem me pergunte,

passeio bem no meio
de uma música triste,
linda. If you knew how
I missed you. Acabaria com meus versos
se pudesse viver sem dizer nada.

Mas não posso. Ainda não.
Não tenho suficiente luz.

05 agosto 2009

A solidão suave e invisível,
amiga e debochada, como fantasma
segue o impacto dos passos, das mãos no teclado,
letras, fragmentos de decisões, escolhas,
curvas e pedras, palavras. Vida, trilha, sigo
o rumo de estrelas desconhecidas, versos,
reversa bússola, tino. Destino? Olhares em saudades,
gestos melancólicos de buscas sem fim
compõem esta canção, queixa, exclamação.
Clamo, canto, engano-me feliz de poesia,
encanto-me e desando em passos tontos,
sem chegada. A morte é parada, fria,
mas não é chegada. Passo por ela escrevendo
uma carta que ela nunca vai ler, um
poema, sem poeta ser. Trilha, vida, vou,
desencarna-se alguma disciplina dos ossos dos erros,
meus, becos e vias sem saída. Resta, a herança,
uma possível via, uma florada de frases
insignificantes, poesia sem poeta, poemas,
tremas esquecidos das intranquilidades,
mares, estradas por onde se tenta alcançar, é isso,
depois, bem depois de muitas milhas,
algum amor.

04 agosto 2009

Rasgar as páginas
não significa lamento;
não acreditar nos poetas,
escrever qualquer coisa
com cara de poema, pão e grão de feijão,
é uma mania de brincar contra as claridades,
um modo de apregoar
primaveras, alheias e belas,
ainda que na boca da noite.
Pode parecer estranho, é
justo modo de tomar outras estradas
e amigar-se do anteontem e do depois
de amanhã. Hoje correr pelas margens,
entrar noite adentro para, quem sabe,
encarar seduzindo o que faz nascer de novo as casas
que dormem. Ver no escuro talvez,
amar mais...

03 agosto 2009

Um tempo foi
I’m going to.
Cantei enquanto ia
e... quando voltei,
o destino, esquerdo,
me atropelou no coração,
com um pensamento, o amor,
de não ir mais going to,
mas só ir go away.

(Ei... let’s go?)
Estou correndo de mim,
das palavras. Há
um pássaro amigo chegando,
pra me levar por ai. Voltei,
no entanto, aqui. Tem um nó
na madeira que usei
para esculpir o anjo. Voltei
para te avisar isto. Quando
teus olhos arderem
em algumas das minhas palavras
saberás que foi
a asa trincada. Perdão.

01 agosto 2009

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16:15 ela falava, falava, reclamando do serviço dele. Ele via uma imagem sem som, com um olho só, preso que estava no reflexo que vinha do prédio em frente. Ardia.


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14:10 o café estava bom. Olhou o céu lindo de agosto lá fora. Tomou do copinho o último gole. O relógio ainda marcava 14:12 e o café já não tinha sabor.


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