Colhendo ostras
Homens e meninos nas pedras colhem ostras.
O sol se reparte em fracos reflexos de despedidas
nas ondas que se rebatem nos rochedos.
O cheiro da maresia,
a luz do fim do dia
marcam como um sino
o desate de certas amarras e cordas,
o acolhimento das aflições.
Se sobe ou desce a maré,
não importa, a hora será
a da Virgem Maria,
a dos afogados,
a da necessidade de tragos,
da dor silenciosa que se sofre sem alarde
e sem busca de remédio
... que não há.
Melhor calar,
um momento que seja,
sem que ninguém perceba,
e além das ostras, colher pensamentos,
aqueles que jamais, jamais
se tornarão palavras,
pois os oferecerei como alimento
para os anjos que me levam e trazem.
Desde os anos de menino
em caminhadas solitárias
buscando o ponto mais alto
para olhar o mar
acostumei meus anjos
a ouvir rosas fechadas,
palavras em botões.
9 comentários:
No crepúsculo, (que beleza de descrição!!), o recolhimento combina com a solenidade da hora...
E, mesmo acolhendo tantos sentimentos à volta, o menino prefere colecionar pensamentos. O menino-grande imita o menino-pequeno: oferece aos mesmos anjos, as palavras contidas, "abotoadas" nas rosas. "Comer rosas fechadas" é uma imagem linda para o silêncio das palavras! Um "alimento" rico de simbolismo.
Gostei. Preciso dizer?
Abraço.
Dora
"Melhor calar,
um momento que seja,
sem que ninguém perceba,
e além das ostras, colher pensamentos..."
Simplesmente maravilhoso!
Eles, homens meninos solitários, catam ostras enquanto remoem pensamentos.
Alguns se vão como as ondas quebradas nas rochas...outros insitem em ir e vir.
Colher e escolher pensamentos para alimentar os anjos que nos colhem como as ostras.
Linda...dá pra sentir o cheiro da maresia e a dor da Ave Maria ao entardecer.
Abraço
Não sou homem nem menino, mas com certeza tenho colhido algumas ostras... meus anjos que o digam! :-P Bjo, querido, gostei muito daqui tbm :-)
bonito, tem um belo final!
Preciso acostumar meus anjos a ouvir rosas fechadas e lágrimas ocultas...
beijo, amigo por encontrar
A insólita imagem dos teus anjos a ouvir rosas fechadas...
É disso, Poeta, é dessa densidade que vive a arte poética.
Ave, Poesia!
Salve, Poeta!
Colhi seus pensamentos, mergulhei no seu mar e, te juro, me vi colhendo ostras.
Lindo, amigo!
"acostumei meus anjos
a ouvir rosas fechadas,
palavras em botões. "
Esta semana tenho escrito sobre Anjos. Cada dia que passa, sinto mais a presença deles...
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