Juntos (seguindo) na escuridão
Estou aqui, fica tranqüila, segura na minha mão.
Está muito escuro, ela diz.
Ele, pensativo, diz, haverá uma saída.
Está muito escuro, ela repete.
Respire devagar, a escuridão não entra nos pulmões.
Sinto frio, ela reclama.
Olha por detrás das palavras em formação,
há calor, ele aconselha.
Vou tentar... sim, talvez... sim..., ela titubeia.
Toma meu cobertor, ele diz.
As palavras em formação, ela pergunta,
são como cachoeiras rumorosas?
Sim, respondeu.
Ainda não vejo, mas ouço bem o rumor.
Um som de tambor ritmado, um mais forte,
outro mais fraco logo em seguida.
Ótimo, ele continua, mais ao fundo você verá
uma janela toda cheia de diminutas
e fracas luzes ...e palavras.
E quando eu me der com elas pela frente,
ela pergunta, o que vou dizer?
Você não dirá nada, ele fala com ternura,
só sentirá mais coragem de encarar a escuridão.
30 setembro 2008
29 setembro 2008
Você
Prestando atenção nas coisas, cruzando palavras,
você vai escrevendo para apurar no fluxo
do sangue, na flor do que se vive, o amor.
Estão bem no alicerce das letras,
além das menores pétalas, o perfume e o mel.
Por enquanto na travessia, você tem o cansaço, mas
o trem nas planícies percorre os trilhos vazando horizontes
e nele você segue o velho desejo do encontro de si mesmo,
para depois, quem sabe, fazer uma fotografia de uma bela colina
perto de um rio para onde você retornaria logo
para construir um abrigo, uma casa, uma vida melhor.
(A poesia é ansiolítica, mas tem efeitos colaterais, certa endoidecência).
Prestando atenção nas coisas, cruzando palavras,
você vai escrevendo para apurar no fluxo
do sangue, na flor do que se vive, o amor.
Estão bem no alicerce das letras,
além das menores pétalas, o perfume e o mel.
Por enquanto na travessia, você tem o cansaço, mas
o trem nas planícies percorre os trilhos vazando horizontes
e nele você segue o velho desejo do encontro de si mesmo,
para depois, quem sabe, fazer uma fotografia de uma bela colina
perto de um rio para onde você retornaria logo
para construir um abrigo, uma casa, uma vida melhor.
(A poesia é ansiolítica, mas tem efeitos colaterais, certa endoidecência).
-
Dauri Batisti
26 setembro 2008
O exato momento do meio-dia
Houve um gigantesco silêncio num segundo,
e então... se ouviu um rumor.
Estranhamente as imensidões
lhe apontavam milhares de peregrinos.
Não. Alucinação não era.
Uma cidade em cada gesto
abria ruas por onde ela via
o que se passava, o que acontecia.
Dançam, dançam... Ela repetia.
Ele com carinho falou, por favor,
me faça ver pelas palavras o que você vê.
É o exato momento do meio do dia, respondeu,
um temporal de muitas águas no alto da noite,
um beija-flor ao parar no ar para tocar o tremor da flor.
Depois ela adormeceu.
Houve um gigantesco silêncio num segundo,
e então... se ouviu um rumor.
Estranhamente as imensidões
lhe apontavam milhares de peregrinos.
Não. Alucinação não era.
Uma cidade em cada gesto
abria ruas por onde ela via
o que se passava, o que acontecia.
Dançam, dançam... Ela repetia.
Ele com carinho falou, por favor,
me faça ver pelas palavras o que você vê.
É o exato momento do meio do dia, respondeu,
um temporal de muitas águas no alto da noite,
um beija-flor ao parar no ar para tocar o tremor da flor.
Depois ela adormeceu.
-
Dauri Batisti
Trem do amanhecer
As estrelas e os mundos
fazem suas encruzilhadas
nas pessoas
e deixam nelas suas interrogações
e enxurradas de poesia.
Quem ama e quem mata vai
seguindo na mesma manhã.
Me empurram quando levemente
o sol rompe o frio.
Sonho olhos que me enxergam,
não os encontro, pois que
os meus próprios tem sua névoas.
- Não, não vou saltar,
this is not the place
... not my station.
Vou prosseguir.
- O senhor está indo pra onde?
(às vezes a poesia me desorienta)
As estrelas e os mundos
fazem suas encruzilhadas
nas pessoas
e deixam nelas suas interrogações
e enxurradas de poesia.
Quem ama e quem mata vai
seguindo na mesma manhã.
Me empurram quando levemente
o sol rompe o frio.
Sonho olhos que me enxergam,
não os encontro, pois que
os meus próprios tem sua névoas.
- Não, não vou saltar,
this is not the place
... not my station.
Vou prosseguir.
- O senhor está indo pra onde?
(às vezes a poesia me desorienta)
-
Dauri Batisti
25 setembro 2008
Ninguém poderia imaginar
Não havia jeito. Não era possível.
Frio, chuvas, ventos,
isolamento, gênios, ânimos,
maus-tratos, dificuldades o tempo todo.
Um dia ensolarado era uma saudade.
Não era possível. Era possível
amar novamente, tentar vida nova.
Ninguém poderia imaginar,
- se bem que poucos os visitavam,
para saber de uma rês desgarrada,
pedir emprestado um galão de diesel... -
Falaram com emoção em amor,
da casa e da beleza do lugar,
montanhas, prados verdes, ar puro,
deram uma trégua para as diferenças
e... desejaram um filho.
Na madrugada, sozinha,
tudo tantas vezes pensado,
ela tomou a velha camionete,
pisou fundo no acelerador
sem se preocupar com o barulho,
e ganhou a estrada.
Pequenas questões:
Por que o título é ninguém podia imaginar?
Por que ela não se preocupa com o barulho?
Não havia jeito. Não era possível.
Frio, chuvas, ventos,
isolamento, gênios, ânimos,
maus-tratos, dificuldades o tempo todo.
Um dia ensolarado era uma saudade.
Não era possível. Era possível
amar novamente, tentar vida nova.
Ninguém poderia imaginar,
- se bem que poucos os visitavam,
para saber de uma rês desgarrada,
pedir emprestado um galão de diesel... -
Falaram com emoção em amor,
da casa e da beleza do lugar,
montanhas, prados verdes, ar puro,
deram uma trégua para as diferenças
e... desejaram um filho.
Na madrugada, sozinha,
tudo tantas vezes pensado,
ela tomou a velha camionete,
pisou fundo no acelerador
sem se preocupar com o barulho,
e ganhou a estrada.
Pequenas questões:
Por que o título é ninguém podia imaginar?
Por que ela não se preocupa com o barulho?
-
Dauri Batisti
23 setembro 2008
O doido, o acidente, as luzes, o olhar...
Ele diz, em dias perdidos os inversos do coração
descem como azeite sobre queimaduras de sustos.
Um inverso oferece a visão mística
do que edifica uma pequena esperança
e desfaz por instantes a aspereza das coisas.
As coisas sempre são ásperas, turvas...
Ele também se referia ao acidente dos dois rapazes:
trabalharam o dia inteiro na padaria
e quando se iam para seu bairro pobre,
um carro em alta velocidade lhes esbarrou na moto.
A moto se desgovernou e os dois...
Os dois voltaram a ser pó do planeta terra,
este multiverso no universo, beleza e dor.
Sabiam que ele era esquisito, mas ouviam
o que ele dizia. Buscavam um sentido.
Mas os inversos, continuou, por mais que ajudem,
não assombram os medos bandos, todos
pássaros ávidos soltos de qualquer espanto,
a devorar a plantação cultivada com suor. Da poesia
só se pode tirar uma força para se manter vigilante
enquanto se aguarda o sol de um certo dia de setembro,
mais uma de suas loucuras, que fará brilhar
uma luz de ternura para todos. Escutam-no
entre risos de disfarçado deboche e respeito.
E quando ele fala umas luzes se acendem,
outras se apagam. No lusco-fusco,
Me vejo.
Ele diz, em dias perdidos os inversos do coração
descem como azeite sobre queimaduras de sustos.
Um inverso oferece a visão mística
do que edifica uma pequena esperança
e desfaz por instantes a aspereza das coisas.
As coisas sempre são ásperas, turvas...
Ele também se referia ao acidente dos dois rapazes:
trabalharam o dia inteiro na padaria
e quando se iam para seu bairro pobre,
um carro em alta velocidade lhes esbarrou na moto.
A moto se desgovernou e os dois...
Os dois voltaram a ser pó do planeta terra,
este multiverso no universo, beleza e dor.
Sabiam que ele era esquisito, mas ouviam
o que ele dizia. Buscavam um sentido.
Mas os inversos, continuou, por mais que ajudem,
não assombram os medos bandos, todos
pássaros ávidos soltos de qualquer espanto,
a devorar a plantação cultivada com suor. Da poesia
só se pode tirar uma força para se manter vigilante
enquanto se aguarda o sol de um certo dia de setembro,
mais uma de suas loucuras, que fará brilhar
uma luz de ternura para todos. Escutam-no
entre risos de disfarçado deboche e respeito.
E quando ele fala umas luzes se acendem,
outras se apagam. No lusco-fusco,
Me vejo.
-
Dauri Batisti
22 setembro 2008
O espelho, o grito, a máquina do tempo, o olhar...
Vamos ver... vou esquecer, ele diz sem convicção.
Sente falta de tudo, mesmo que tudo fosse uma mentira.
Carinho mentiroso só faz mal depois;
na hora também é bom.
Dói. Mas eu saio dessa.
Vamos ver... A última vez que a vi?
Bem... Foi em setembro. Chovia.
Ela se olhava num grande espelho na sala,
ajeitando os cabelos, retocando o batom.
Ela olhava pelo espelho, muda,
escutava como se estivesse atrasada.
Depois virou-se, e com o olhar apontou a porta.
Aquele olhar... foi um grito,
um grito que fez eco sem emitir nenhum som,
gritou um vai embora que grita agora
no filme que assiste.
De tão claro que vê o grito se espanta
quando percebe a lonjura dos anos
e aquele vai embora tão perto.
Carrega-o como máquina do tempo para voltar,
sempre, ao mesmo ponto.
...Silêncio.
Acabou sua hora, disse o analista.
Me vejo.
Vamos ver... vou esquecer, ele diz sem convicção.
Sente falta de tudo, mesmo que tudo fosse uma mentira.
Carinho mentiroso só faz mal depois;
na hora também é bom.
Dói. Mas eu saio dessa.
Vamos ver... A última vez que a vi?
Bem... Foi em setembro. Chovia.
Ela se olhava num grande espelho na sala,
ajeitando os cabelos, retocando o batom.
Ela olhava pelo espelho, muda,
escutava como se estivesse atrasada.
Depois virou-se, e com o olhar apontou a porta.
Aquele olhar... foi um grito,
um grito que fez eco sem emitir nenhum som,
gritou um vai embora que grita agora
no filme que assiste.
De tão claro que vê o grito se espanta
quando percebe a lonjura dos anos
e aquele vai embora tão perto.
Carrega-o como máquina do tempo para voltar,
sempre, ao mesmo ponto.
...Silêncio.
Acabou sua hora, disse o analista.
Me vejo.
-
Dauri Batisti
20 setembro 2008
A ilha, o avião, o conto sem graça, o olhar...
A ilha esconde,
por detrás da montanha de onde tudo se avista,
a pista de pouso esburacada
onde está o avião quebrado invadido
pelo azul de mais um dia sem hora.
Parece tarde. A página é virada.
Ele anda em círculos, no topo, com uma ferida
a sangrar na mão. Acena com uma bandeira.
A felicidade, uma promessa,
grita-lhe nos escuros do coração:
fecha os olhos, fecha os olhos,
é setembro, aguarda. Mas ele não espera,
ele olha. Olha em trezentos e sessenta graus.
O raio do olhar é seu ultimo poderio.
Nenhum avião, nenhum barco,
somente a vida latejando na mão
que umedece de vermelho-férreo a haste da bandeira.
O pedido de socorro tremula cores de sonhos.
O coração é um mar, um mar, mar.
Nada é original, o conto sem graça.
Amar é esperar mesmo sem constelações um sinal de luz, pensa.
O mar se torna só ruídos, assustador, o dia perde a cor,
providenciará lenha, fará outra fogueira.
Me vejo.
A ilha esconde,
por detrás da montanha de onde tudo se avista,
a pista de pouso esburacada
onde está o avião quebrado invadido
pelo azul de mais um dia sem hora.
Parece tarde. A página é virada.
Ele anda em círculos, no topo, com uma ferida
a sangrar na mão. Acena com uma bandeira.
A felicidade, uma promessa,
grita-lhe nos escuros do coração:
fecha os olhos, fecha os olhos,
é setembro, aguarda. Mas ele não espera,
ele olha. Olha em trezentos e sessenta graus.
O raio do olhar é seu ultimo poderio.
Nenhum avião, nenhum barco,
somente a vida latejando na mão
que umedece de vermelho-férreo a haste da bandeira.
O pedido de socorro tremula cores de sonhos.
O coração é um mar, um mar, mar.
Nada é original, o conto sem graça.
Amar é esperar mesmo sem constelações um sinal de luz, pensa.
O mar se torna só ruídos, assustador, o dia perde a cor,
providenciará lenha, fará outra fogueira.
Me vejo.
-
Dauri Batisti
18 setembro 2008
As ruas, o asfalto, os meninos, o olhar...
Corre, o irmão grita,
corre, corre, e ele vai
como se a corrida na chuva
fosse esquentar dentro dele
uma ausência, uma parte fria, sempre.
Chove e as ruas tão íntimas
se iluminam de baixo para cima,
faíscas, faíscas. Que lindo!
A corrida mais longa que uma brincadeira
faz com que perceba a escuridão.
Se abriga num beco
bem junto ao irmão, colados, escondidos,
ofegantes, água e espanto
escorrendo pelo rosto. Meninos.
O irmão confere o dinheiro do dia.
Por que estamos fugindo?
Como resposta ouve tiros, gritaria,
eles estão aqui, eles estão aqui.
...
Vê o irmão correndo, chamando por ele,
O irmão corre, corre chamando por ele.
Tudo fica ainda mais escuro. Tem sono.
Quieta, a platéia assiste “Setembro”.
Me vejo.
Corre, o irmão grita,
corre, corre, e ele vai
como se a corrida na chuva
fosse esquentar dentro dele
uma ausência, uma parte fria, sempre.
Chove e as ruas tão íntimas
se iluminam de baixo para cima,
faíscas, faíscas. Que lindo!
A corrida mais longa que uma brincadeira
faz com que perceba a escuridão.
Se abriga num beco
bem junto ao irmão, colados, escondidos,
ofegantes, água e espanto
escorrendo pelo rosto. Meninos.
O irmão confere o dinheiro do dia.
Por que estamos fugindo?
Como resposta ouve tiros, gritaria,
eles estão aqui, eles estão aqui.
...
Vê o irmão correndo, chamando por ele,
O irmão corre, corre chamando por ele.
Tudo fica ainda mais escuro. Tem sono.
Quieta, a platéia assiste “Setembro”.
Me vejo.
-
Dauri Batisti
17 setembro 2008
O desenho, a estação, o olhar...
A voz caiu cansada de dizer te amo.
Uma coisa quase morta,
um hematoma,
um incômodo
impedem-lhe de escrever,
de dizer desencanto, nem isso.
Usa o lápis para desenhar, traços agitados,
feitos às pressas na estação. O trem vai chegar.
Um gato tenta escapar da trama,
do lápis que reforça as linhas da rede. Que idéia!
O olhar pára no desenho, destaca a folha do bloco,
o lápis volta para o bolso, chega o trem. É setembro.
Em meio à confusão de quem vai, de quem vem,
um momento estranho, calmo. Ele não embarca,
fica parado, mala ao lado. A folha com o desenho
vai com o vento e o trem.
A voz vagarosamente se levanta no pulmão,
voltará para dizer outras vezes te amo.
Entre o sentimento poderoso e a decisão abandonada,
ele fica invisível, algo se apaga.
Me vejo.
A voz caiu cansada de dizer te amo.
Uma coisa quase morta,
um hematoma,
um incômodo
impedem-lhe de escrever,
de dizer desencanto, nem isso.
Usa o lápis para desenhar, traços agitados,
feitos às pressas na estação. O trem vai chegar.
Um gato tenta escapar da trama,
do lápis que reforça as linhas da rede. Que idéia!
O olhar pára no desenho, destaca a folha do bloco,
o lápis volta para o bolso, chega o trem. É setembro.
Em meio à confusão de quem vai, de quem vem,
um momento estranho, calmo. Ele não embarca,
fica parado, mala ao lado. A folha com o desenho
vai com o vento e o trem.
A voz vagarosamente se levanta no pulmão,
voltará para dizer outras vezes te amo.
Entre o sentimento poderoso e a decisão abandonada,
ele fica invisível, algo se apaga.
Me vejo.
-
Dauri Batisti
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