Arrebente-se em sonhos (já em setembro)
Telhas de barro malcozido, mau assentadas,
luz pelas frestas formando anjos compridos,
muitos, de pequenos fios e coisinhas flutuantes.
Calmo o sol avança ignorando o desejo, os sonhos
que se foram embora. Já em setembro
tantos se foram, poesia que não vivi.
Outros sempre chegam, sem convite,
descarregando desejos que me eletrizam.
Olhar para o alto sem saber o que fazer exatamente,
mas com cada músculo pronto para saltar.
Telhas que deixam passar o que deviam reter:
estes raios compridos, insufladores, instigadores.
Em qualquer lugar e de várias formas
me dou com eles a sussurrar: arrebente-se em sonhos,
refaça-se em rebeldia a cada sol que se levanta.
Eu queria me amansar, mas não me disciplino,
o que me faria bem-aventurado não me faria feliz.
Deus mesmo é o culpado.
13 setembro 2008
11 setembro 2008
Me espero água a noite passa
Palavras águas
me molham e de pouco
me alivio dessa alma
arteira que me inventa seco
diferente a cada frase
a cada lua mais sedento.
Tenho vontade de dormir
não consigo
as palavras águas são poucas
gotas. O que me vira são episódios
de aflição em capítulos longos
coisa sem nenhuma razão resseca.
Me espero água a noite passa
palavra que acaba não a aflição
não volto sigo na ânsia ressequido
avariado navio encalhado
em hora de maré que demora.
A janela muralha dorme fechada
mesmo com o sol levemente erguido
parede batida pela chuva
que ouço forte lá fora
escorre água bendita não morro.
Há uma fresta.
Palavras águas
me molham e de pouco
me alivio dessa alma
arteira que me inventa seco
diferente a cada frase
a cada lua mais sedento.
Tenho vontade de dormir
não consigo
as palavras águas são poucas
gotas. O que me vira são episódios
de aflição em capítulos longos
coisa sem nenhuma razão resseca.
Me espero água a noite passa
palavra que acaba não a aflição
não volto sigo na ânsia ressequido
avariado navio encalhado
em hora de maré que demora.
A janela muralha dorme fechada
mesmo com o sol levemente erguido
parede batida pela chuva
que ouço forte lá fora
escorre água bendita não morro.
Há uma fresta.
-
Dauri Batisti
07 setembro 2008
Imigrante (caí no lugar passado, a literatura)
Talvez...
Talvez sejam as marcas do cemitério,
visitado tantas vezes ao lado do meu avô
que subindo ia contando a história
daqueles que viveram em tempos em que não vivi.
E, me parecia impossível que tivessem vivido antes de mim.
Decidi que queria voltar e acompanhá-los na aventura,
e dizer que surgiria um parente, menino ainda,
mas que gostava deles,
consolando-os pelo fim que no futuro viria.
Se bem que talvez eu gostasse mesmo
das fotos em preto e branco nos seus túmulos.
Eu era deles o desdobrar das células.
Eu era o futuro que só se deu depois do fim.
Um homem precisaria ver muitas gerações
talvez para se contentar e morrer
sem desespero. Esperando,
que é o que faz viver.
Isso acontecia sempre no dia de finados,
logo bem cedinho,
e este era o único dia em que a ida ao cemitério
não me causava sentimentos estranhos.
Depois voltávamos, esperávamos o almoço
e meu avô bebia vinho. Eu que não podia
bebia imagens. Elas se repetiam na mente,
túmulos e fotos preto e branco,
gente com cara simpática,
roupas e bigodes estranhos
mas que eram o suporte do meu corpo
e a estrutura da minha alma.
E quando eles partiram lá de longe,
do porto de Gênova em seus vapores imundos
iam mundo afora, esperando o que depois do mar?
Daria tudo pra fazer o mesmo trajeto ao lado deles
só para sentir e ver o mundo diferente
deixando tudo – que experiência!
E respirar o ar salgado do atlântico
e ser parido de novo na nova terra.
Nasci no lado de cá
e pude me contentar com as histórias.
Fiquei abarrotado delas.
Talvez por isso,
na sofreguidão de desvencilhar-me
das garras do (in)certo futuro
para poder viver o que tenho
– momentos, beber a vida como vinho bom -,
impregnado de contos que fui,
cai no lugar passado, a literatura.
Sou filho das palavras, dos contos
das histórias e, quem sabe,
ser assim é ser outro ser,
ou qualquer coisa que não morre
mas também não sabe viver.
Vive saltando entre os tempos e as eras
e o presente é somente o porto onde se ancora
para se ler e escrever.
Talvez...
Talvez sejam as marcas do cemitério,
visitado tantas vezes ao lado do meu avô
que subindo ia contando a história
daqueles que viveram em tempos em que não vivi.
E, me parecia impossível que tivessem vivido antes de mim.
Decidi que queria voltar e acompanhá-los na aventura,
e dizer que surgiria um parente, menino ainda,
mas que gostava deles,
consolando-os pelo fim que no futuro viria.
Se bem que talvez eu gostasse mesmo
das fotos em preto e branco nos seus túmulos.
Eu era deles o desdobrar das células.
Eu era o futuro que só se deu depois do fim.
Um homem precisaria ver muitas gerações
talvez para se contentar e morrer
sem desespero. Esperando,
que é o que faz viver.
Isso acontecia sempre no dia de finados,
logo bem cedinho,
e este era o único dia em que a ida ao cemitério
não me causava sentimentos estranhos.
Depois voltávamos, esperávamos o almoço
e meu avô bebia vinho. Eu que não podia
bebia imagens. Elas se repetiam na mente,
túmulos e fotos preto e branco,
gente com cara simpática,
roupas e bigodes estranhos
mas que eram o suporte do meu corpo
e a estrutura da minha alma.
E quando eles partiram lá de longe,
do porto de Gênova em seus vapores imundos
iam mundo afora, esperando o que depois do mar?
Daria tudo pra fazer o mesmo trajeto ao lado deles
só para sentir e ver o mundo diferente
deixando tudo – que experiência!
E respirar o ar salgado do atlântico
e ser parido de novo na nova terra.
Nasci no lado de cá
e pude me contentar com as histórias.
Fiquei abarrotado delas.
Talvez por isso,
na sofreguidão de desvencilhar-me
das garras do (in)certo futuro
para poder viver o que tenho
– momentos, beber a vida como vinho bom -,
impregnado de contos que fui,
cai no lugar passado, a literatura.
Sou filho das palavras, dos contos
das histórias e, quem sabe,
ser assim é ser outro ser,
ou qualquer coisa que não morre
mas também não sabe viver.
Vive saltando entre os tempos e as eras
e o presente é somente o porto onde se ancora
para se ler e escrever.
-
Dauri Batisti
05 setembro 2008
Manhã de segunda feira (página marcada)
No filme,
no sonho,
no quarto que clareia, te conheci outra,
desta mesma que todos os dias e noites tenho aqui.
Despertei.
Desejei
outro domingo
na manhã opressiva e azul de segunda-feira
quando displicentemente me deixaste nas mãos
mais um dos teus livros ao me chamar,
e foste para a cozinha passar o café,
acordar as crianças e abrir o dia de todos
com o teu sempre bom humor.
Sonhei,
Acordei,
ou li?
Talvez,
a página marcada deste livro
me possa responder e me faça ver
- sendo quem sou e vivendo o que tenho -
as belezas da vida que está aqui.
No filme,
no sonho,
no quarto que clareia, te conheci outra,
desta mesma que todos os dias e noites tenho aqui.
Despertei.
Desejei
outro domingo
na manhã opressiva e azul de segunda-feira
quando displicentemente me deixaste nas mãos
mais um dos teus livros ao me chamar,
e foste para a cozinha passar o café,
acordar as crianças e abrir o dia de todos
com o teu sempre bom humor.
Sonhei,
Acordei,
ou li?
Talvez,
a página marcada deste livro
me possa responder e me faça ver
- sendo quem sou e vivendo o que tenho -
as belezas da vida que está aqui.
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Dauri Batisti
01 setembro 2008
Vida torta
Procurando caminhos em expansões escuras e frias
a estrela em seus mundos brilha mais ainda quando
o pássaro faminto pousa ali sobre a mesa ao alcance da mão.
A linha que existe, e não se explica,
entre os mundos daquela estrela e o pássaro,
se dobra formando um espírito que me atravessa
revelando mistérios insignificantes.
O olhar antes divagante em preocupações passa
e ocupa-se em contemplações do bem-te-vi.
De longe eu desenhava o pássaro pelo seu canto:
lindo, poético, perfeito.
De perto agora ele se mostra um vivente
com a perna torcida, quebrada um dia
e vagarosamente cicatrizada,
torta.
Procurando caminhos em expansões escuras e frias
a estrela em seus mundos brilha mais ainda quando
o pássaro faminto pousa ali sobre a mesa ao alcance da mão.
A linha que existe, e não se explica,
entre os mundos daquela estrela e o pássaro,
se dobra formando um espírito que me atravessa
revelando mistérios insignificantes.
O olhar antes divagante em preocupações passa
e ocupa-se em contemplações do bem-te-vi.
De longe eu desenhava o pássaro pelo seu canto:
lindo, poético, perfeito.
De perto agora ele se mostra um vivente
com a perna torcida, quebrada um dia
e vagarosamente cicatrizada,
torta.
-
Dauri Batisti
31 agosto 2008
Os passos mais criavam a queda do que um caminho,
mas ele seguia como se abrisse uma estrada.
Corria no estômago uma fome navalha
uma fome cortante que nem um pão sacia,
e para além do que ele podia ir, caiu,
espatifou-se com a cara no chão e se viu,
por um instante se reconheceu no rés,
no destino de chão, no gosto de sangue na boca e poeira.
Passado o instante voltou a agonia
de correr, ir e saltar sobre o precipício
como se o correr e a agonia formassem penas,
... e leveza.
mas ele seguia como se abrisse uma estrada.
Corria no estômago uma fome navalha
uma fome cortante que nem um pão sacia,
e para além do que ele podia ir, caiu,
espatifou-se com a cara no chão e se viu,
por um instante se reconheceu no rés,
no destino de chão, no gosto de sangue na boca e poeira.
Passado o instante voltou a agonia
de correr, ir e saltar sobre o precipício
como se o correr e a agonia formassem penas,
... e leveza.
-
Dauri Batisti
29 agosto 2008
Passeoabadá.
Hum?
Passeoabadá.
Hum?
Passeoabadá se não te dou um tiro.
Logo ali na no porto o minério caía sem parar
no porão do navio.
Passeoabadá.
Hum?
Passeoabadá.
Hum?
Passeoabadá se não te dou um tiro.
Logo ali na ilha a rainha se preparava
para a festa.
Passeoabadá.
Hum?
Pápápápá...
Dois tiros na barriga,
16 anos,
correria, hospital, a rainha
de nada soube, o navio se foi.
Tudo continua.
Hum?
Hum?
Passeoabadá.
Hum?
Passeoabadá se não te dou um tiro.
Logo ali na no porto o minério caía sem parar
no porão do navio.
Passeoabadá.
Hum?
Passeoabadá.
Hum?
Passeoabadá se não te dou um tiro.
Logo ali na ilha a rainha se preparava
para a festa.
Passeoabadá.
Hum?
Pápápápá...
Dois tiros na barriga,
16 anos,
correria, hospital, a rainha
de nada soube, o navio se foi.
Tudo continua.
Hum?
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Dauri Batisti
26 agosto 2008
Arde, queima, incendeia-me,
procuro nas mãos, no peito,
por dentro, por fora,
ontem, agora, e não encontro,
até que me dou conta que está nos olhos
este fogo, este ardor,
nem de dor, nem de amor. De algo triste,
sem ser de tristeza mesmo que me entristeça.
Procuro um livro, uma aventura,
um café, uma quentura, outra
que não esta que me seca os olhos
e me expõe aos outros,
nu, maltrapilho, maldormido.
Sem sonhos me escondo,
chamo as palavras, nada fala,
de nada falo, não sei o nome, o que sinto
é o silêncio que vem das estepes, parece,
cinza como lobo, olho que arde
quando olho pra dentro vejo cinza,
vejo fora, arde, queima o que resta, enfim
...
o silêncio cinza-me pelo chão.
Um vento bom sem pretensão
passa e levanta-me no ar...
É a "deixa" para eu renascer.
procuro nas mãos, no peito,
por dentro, por fora,
ontem, agora, e não encontro,
até que me dou conta que está nos olhos
este fogo, este ardor,
nem de dor, nem de amor. De algo triste,
sem ser de tristeza mesmo que me entristeça.
Procuro um livro, uma aventura,
um café, uma quentura, outra
que não esta que me seca os olhos
e me expõe aos outros,
nu, maltrapilho, maldormido.
Sem sonhos me escondo,
chamo as palavras, nada fala,
de nada falo, não sei o nome, o que sinto
é o silêncio que vem das estepes, parece,
cinza como lobo, olho que arde
quando olho pra dentro vejo cinza,
vejo fora, arde, queima o que resta, enfim
...
o silêncio cinza-me pelo chão.
Um vento bom sem pretensão
passa e levanta-me no ar...
É a "deixa" para eu renascer.
-
Dauri Batisti
24 agosto 2008
Eu sobrevoava as plantações onde trabalhavas,
te via correndo e acenando
pela alegria de me ver passar rasante
e ficava tão feliz lá no alto.
Agora não queres mais sair de casa,
não te vejo mais, voei demais, cansaste.
Adoeceste Anda.
Terá sido o pesticida que eu borrifava sobre as plantações
o causador desta falta de desejo de andar?
Mas se fui eu, minha querida Anda,
deixei de voar;
o que quero mesmo está aqui no chão,
é a estrada que juntos vamos trilhar.
Anda, minha querida Anda,
vim correndo só pra te dizer isto.
Te amo Anda.
Anda, levanta, vamos...
te via correndo e acenando
pela alegria de me ver passar rasante
e ficava tão feliz lá no alto.
Agora não queres mais sair de casa,
não te vejo mais, voei demais, cansaste.
Adoeceste Anda.
Terá sido o pesticida que eu borrifava sobre as plantações
o causador desta falta de desejo de andar?
Mas se fui eu, minha querida Anda,
deixei de voar;
o que quero mesmo está aqui no chão,
é a estrada que juntos vamos trilhar.
Anda, minha querida Anda,
vim correndo só pra te dizer isto.
Te amo Anda.
Anda, levanta, vamos...
-
Dauri Batisti
20 agosto 2008
Agitei o espírito em olhares rápidos,
abri a porta em duas partes azuis.
Entrou um ar de terra seca e ardida,
um ar de agosto bem longe, distante
tempo que agora só existe no coração.
Veio um pó de sustos e espantos santos,
o que eu não sabia que batia à porta,
me batia, ferida que no susto não sangra,
por entre as partes da porta que eu via
esta espécie de amor nunca esquecido,
lembranças, outra era a porta que se abria:
eu me via menino ao te ver linda chegar
da cidade com os braços cheios, embrulhos caindo
para cada um, nada esquecido, um tecido,
um par de sapatos ou outra coisa,
pouco dinheiro muito bem dividido.
- Mãe!
abri a porta em duas partes azuis.
Entrou um ar de terra seca e ardida,
um ar de agosto bem longe, distante
tempo que agora só existe no coração.
Veio um pó de sustos e espantos santos,
o que eu não sabia que batia à porta,
me batia, ferida que no susto não sangra,
por entre as partes da porta que eu via
esta espécie de amor nunca esquecido,
lembranças, outra era a porta que se abria:
eu me via menino ao te ver linda chegar
da cidade com os braços cheios, embrulhos caindo
para cada um, nada esquecido, um tecido,
um par de sapatos ou outra coisa,
pouco dinheiro muito bem dividido.
- Mãe!
-
Dauri Batisti
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