11 novembro 2009

vertere seria ludo XI

Os dias, frágeis louças do serviço
do prazer, se contam em somas
de prejuízos. Jogo que se impõe
viver, a se querer ou não: lançar

pétalas ao fogo até restar a haste

nas mãos. O limite do número de pétalas
tornar-se-á sentido e significado quando,
por entre as equações de rosas desfeitas,
se levantar em geometrias lindas

o inumerável amor. As pétalas se vão

ao fogo, a haste guarda-se no bolso.
A espionagem amorosa dos entendimentos
dos segredos desenhados na louça,
não desprezará, no cômputo geral,

o peso do perfume.

09 novembro 2009

vertere seria ludo X

O peso de uma pedra
se dissipa (há uma chance)
na luz de um olhar.
Pégaso atravessa a tarde

em corpúsculos invisíveis.

Quem irá cavalgá-lo não
será a pergunta, mas
como abandonar-se ao seu voo,
pela densidade de cada coisa,

de cada dia. Não restará

da transparência um vidro estilhaçado,
o tédio. Há de ser (espero)
o dia comum um imenso livro
amarelo, o tratado da dança

e do canto, aberto na página que versa

sobre a teimosia deste jardim resseco
que naquela rosa se transubstancia.

08 novembro 2009

vertere seria ludo IX

Um ciclo de gritos, fracassos, ensaios
de admiração do belo e espanto: códigos
ainda, poemas depois. Alguns cães
ladram diante do hábito amarelo

do monge do farol que vai (ou que vem).

Lâmpadas, labaredas, amor
criam luzes, sinalizam rumos
e mares a se navegar. Se há
uma ventania nos lados de dentro

o vento é um impulso

para a cor dourada do sol. Viver,
invenção de fazer resumos de mares,
pedras, flores, átomos num
rubro mundo pulsante no peito.

O jogo de entendimentos das coisas

firma-se em letras e no preço de dizer
cada uma pelo doce do nome. Espinhos
e vinhos são barcos que passam. Um traço
no fim de tudo mistura no mesmo vaso

o auge do voo das gaivotas e das constelações.

07 novembro 2009

vertere seria ludo VIII

Uma fragata produz poesia
nos temporais e tempestades
com uma porção de prazer
e outra de sustos. Viver é

cair num abismo, e amar

é o sentido oposto, subir.
O abismo permanece, todavia.
No transverso da sede de falar,
a música ensina o que ainda

não se sabe, ouvir. O fundo

do fundo do coração deve ser escuro,
com pequenas e preciosas luzes,
onde é provável se encontra o verso
que mansamente constrói estrelas.

06 novembro 2009

vertere seria ludo VII

De qualquer modo é melhor
um trovão de susto e descobrir
o dia, ainda que tarde, do que
acompanhar a sombra do tempo

e ajudá-la a barganhar seus mofados pães

com os chacais. A coragem não virá
dos lamentos em fins de outono
sobre a bondade da palavra renasço
que não foi usada na frase do amanhecer.

Enxergar será lindo, a flor

surgiu do chão resseco, e é única.
A balança que pesa o coração
é regida pela mesma matemática que soma
a claridade, o calor (amor) e a leveza

na longa(?) viagem dos raios do sol.

05 novembro 2009

vertere seria ludo VI

O que vale no acúmulo
é o tesouro
que do monte foge.
Amontoar só vale

pelo riozinho que

por entre os montes corre.
Beber sua água,
correr por suas margens,
descer nas corredeiras

faz uma riqueza por

dentro, entre os amargos
de viver. Dá um estalo
de desprendimento
soltar do bambuzal

a poesia que jamais foi pega

pelas palavras que por aqui se acham,
ossos descobertos pelos ventos.

04 novembro 2009

vertere seria ludo V

O tempo de dançar estima-se
é o prazo de um fogo. A vigília
já termina. O tempo é de ir.
Ignora-se as roseiras floridas.

A presença querida se avista

ao longe num outro jardim. Rosas
amarelas e poesias de amor.
Mas, desconhecido é o poema,
o autor e o título do livro. Será

preciso ler a primeira página e encontrar

a tradução de cavalos indomados
na língua virada dessas palavras.
Se assim se der, a festa recomeça.

03 novembro 2009

vertere seria ludo IV

Mesmo o melhor olhar,
o de amor, sempre acontece,
emudece de ver, ainda que
no dia mais azul.

De que vale a limpidez do dia

quando o passo de ir e a
vontade de dizer te amo
assombra-se em reviravoltas
de incertezas da hora.

O fogo avança, e é,

e seja o que possa significar,
um tanto é pouco, tal
é a ânsia. O que por dentro anda,
anda mais do que se pode ver

do alto da montanha. Talvez

em círculos. Porque também
se perde o passo quando se ama
e se fica dando voltas
no próprio coração.

O bem-te-vi rascunho

traz no bico a flor dourada
de benzer a noite,
para se ter um sonho lindo, apesar.

02 novembro 2009

vertere seria ludo III

Atirar ao vento as palavras
mais solenes e amaciar
com o refugo dos sonetos,
que é a melhor parte deles,

a sola dos pés e as curvas dos caminhos.

E, a seguir, na hora da noite que convier,
arremessar a pedra dos sonhos no fogo
e deixar ir aos céus as faíscas da liberdade.
Poderá assim nascer um desejo

de cantar os salmos do amanhecer.

Nada é certo, todavia, vai que
o peso do dia como água
caia sobre as asas do beija-flor
...e tudo seja outra coisa.

01 novembro 2009

vertere seria ludo II

As outras cores do sol se vão,
escondidas, para debaixo
das asas da coruja.
Enquanto ela voa e, se

no chafariz correr água

bem limpa, as cores
aparecerão no rosto
das crianças que ali brincam
explodindo água em versos.

Dir-se-á que é noite
abrindo-se em belo dia.